Depois de tantos anos, achei que já sabia. Num mundo que fazia sentido, as previsões do tempo estavam sempre certas. Achei que podia ler a mímica das nuvens, a língua de sinais de um céu que não tinha mistérios. Não via que a sombra estava sobre mim, e eu sonhambulando. Talvez eu tenha visto, mas pensei que havia amor suficiente em mim para conversar com sua mudez. Metida num silêncio escuro, você mente: “vamos superar isso”. Então, provei seus amigos, seus gostos, suas músicas, mas — por excesso de peso ou desprezo — não caíam bem: sufocavam meu pescoço ou apertavam meus braços, justas demais. Mesmo acertando em todos os presentes de aniversário, nunca soube o que você queria. Achei mesmo que podia prever a chuva nos seus olhos nublados. Quando o tempo esfriou e você não voltou pra casa, coloquei as gotas de nossa tempestade num copo vazio. Agora eu via que não era transparente, mas era com certeza insípida. Quando eu vou aprender a distinguir as nuvens dos sinais de fumaça? Enquanto tentava entender, me tornei um estrangeiro num mundo do qual nunca fiz parte — a não ser em todas as vezes que interpretei, com maestria, o papel do estranho que estava sempre ao seu lado.
Inspirado na letra da música Strange, de Tori Amos.
Inspirado na letra da música Strange, de Tori Amos.