quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Oblíquo


O amava, mas tão imprópria quanto um pronome oblíquo no início de uma frase. Era um amor pálido, arco-íris sem gotículas, difuso como a última sombra que o por-do-sol descartou. Seus dias eram dúbios, certezas apagadas na paixão, ilhadas por questões de todos os lados. Seus olhos mentiam a cada hora, cada dia, marcando a fronteira entre o vizinho “te amo” e o distante “amo você” (às vezes, seguido do vocativo redundante, dupla mentira, “meu amor”). Mentia porque precisava. Vir, ver, vencer. Seu sangue bombeava liberdade pelo seu corpo, ao que o cérebro respondia com necessidade. Ficaria ali até quando não mais estivesse em si. Lábios frígidos de desamor tocavam o outro ouvido com a doçura das falsidades mais tenras. Era sua especialidade. Seus seios latejavam de angústia, que ela transfigurava num desejo maquiado, mamilos eriçados de frio. Suas coxas tremiam de rigor, que ela manejava em orgasmo forçado. O nome do que lhe possuía saltava de sua boca na rejeição murmurada, queimando amargo em sua língua, travestido de deleite. E assim seria: de casa em casa, de cama em cama, de amor em amor... até que não mais murmurasse. Até que encontrasse aquele que lhe desnudasse da falsidade do amor perfeito. E a esse, amava-o.